STF considera crime o não pagamento de ICMS
- M. CAMPOS advogados
- 26 de ago. de 2020
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Em julgamento de 12 de dezembro de 2019, a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal decidiu considerar como crime o não pagamento do ICMS, ainda que declarado, sob o argumento de que ao embutir o valor do imposto na mercadoria o empresário estaria cobrando esse valor do consumidor e não repassando ao Fisco. O julgamento foi suspenso naquela ocasião pelo pedido de vista do ministro Dias Toffoli.
A recente prisão de uma grande empresário do setor de eletrodomésticos acendeu a luz amarela para advogados e departamentos jurídicos. A medida é reflexo desse entendimento do STF, segundo o qual deixar de pagar imposto virou crime.
No sistema tributário brasileiro há tributos que são cobrados dos contribuintes por terceiros, para facilitar a arrecadação. É o caso do ICMS em substituição tributária. O consumidor é o contribuinte e o empresário apenas desconta o valor do imposto e o repassa ao Fisco. Esses recursos não integram o patrimônio daquele que cobra o imposto. Nesse caso, deixar de repassá-lo se caracteriza como apropriação indébita.
Mas não é o caso do ICMS próprio. Para esse tributo, o consumidor não é o contribuinte, não tem qualquer relação jurídica com o Fisco. Ele apenas tem que pagar o tributo que, às vezes, está embutido no preço da mercadoria. Ora, muitos outros custos também estão embutidos no preço da mercadoria (aluguel, salário dos funcionários, matéria-prima) e nem por isso o consumidor tem alguma relação jurídica com esses terceiros.
No entanto, adotando essa posição, o STF considera que o não pagamento do ICMS é crime. E isso poderá se estender a outros tributos por analogia. O Imposto de Renda e o ISS, por exemplo, têm repercussão econômica no preço dos produtos. Por essa linha de raciocínio, não pagá-los seria considerado apropriação indébita.
Essa orientação não considera que no caso do ICMS próprio o empresário é o contribuinte direto. Ele não cobra o imposto do consumidor, mas apenas o preço da mercadoria, que ingressa diretamente no seu patrimônio. Portanto, o empresário que não paga o ICMS próprio não se apropria de valor algum. Ele apenas passa a ser devedor do Fisco, mas não comete crime.
A própria Constituição veda a prisão por dívida, exceto no caso de pensão alimentícia. O STF, porém, feriu o texto constitucional ao criminalizar a inadimplência de um tributo.
Mas não significa também que empresários serão denunciados automaticamente. O STF deverá modular essa reviravolta na jurisprudência, que não deve retroagir, a fim de salvaguardar aqueles que agiram em um contexto jurisprudencial diferente.
Ademais, as presunções não são aceitas no Direito Penal, fazendo-se necessária a demonstração, no caso concreto, da decomposição do preço de cada produto e a comprovação de que os custos tributários foram embutidos integralmente no preço, sem abatimentos, e que o consumidor efetivamente pagou o custo tributário antes da data prevista para pagamento do imposto.
Os obstáculos para esse cálculo são praticamente intransponíveis. Mas a prova, no Direito Penal, deve abranger cada um desses elementos.
Como se percebe, os Tribunais receberão grande volume de discussões até que se alcance alguma segurança jurídica a partir desse posicionamento do STF.
por Marcio Eduardo de Campos
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